No passado sábado, o jornal Record ter deu destaque à realidade columbófila açoriana. A FPC também conversou com o columbófilo Luís Soares, um dos entusiastas deste desporto no arquipélago.
Na Ilha de São Miguel há duas coletividades, o Clube Columbófilo de São Miguel (CCSM) e o Clube de Amigos da Columbofilia do Nordeste (CACN). Na Ilha Terceira existe o terceiro clube açoriano, a Sociedade Columbófila da Ilha Terceira.
Luís Soares é presidente da direção do CCSM, clube fundado há 16 anos e um dos impulsionadores da columbofilia no arquipélago, estando ainda envolvido nas atividades, de cariz mais lúdico, do CACN.
– Desde quando é columbófilo?
Luís Soares (LS) – Sou columbófilo há vários anos. Federado há cerca de 20 anos, mas já tinha pombos-correio antes disso.
– Como chegou ao mundo da columbofilia?
LS – Acho que cheguei de forma semelhante a qualquer outro columbófilo. Comecei a ver os pombos-correio, a contactar com aqueles que já estavam ligados à modalidade, depois, pouco a pouco, fui pedindo pombos e comecei assim.
– Sendo originário do Continente iniciou a prática da Columbofilia no continente ou já nos Açores?
LS- Em termos competitivos iniciei – me aqui, nos Açores, mas, foi no Continente, nomeadamente no Alentejo que dei os primeiros passos na columbofilia. Na altura não competia, porque a minha vida não permitia, a Faculdade, limitava-me muito o tempo disponível.
– Como concilia a sua atividade profissional, é médico, com a prática da columbofilia
LS- A columbofilia para mim, e, julgo, que para a maioria dos columbófilos, é uma paixão e, por isso, acabamos por arranjar tempo para conciliar com a vida profissional. Gostava de ter mais disponibilidade, mas sendo o meu hobby preferido, tento projetar o meu tempo livre na columbofilia.
Com raízes no Alentejo, o dirigente falou das suas motivações para continuar a praticar a modalidade.
Sendo a columbofilia uma modalidade de raiz popular, que motivações o levaram a praticar a modalidade?
LS- Essa é a pergunta de “um milhão de dólares”. A motivação… é transversal a toda a gente: é o gosto pelo pombo-correio, a paixão pela criação dos animais, é ver as chegadas após anos de trabalho. É algo que nos motiva, ano após ano, a continuar a prática da modalidade. A raiz eu não sei, mas as motivações são estas.
Considera a columbofilia um desporto sem qualquer tipo de faixa etária, profissão ou proveniência definida, ou seja, um desporto transversal e universal ao nível dos seus praticantes?
LS- Sim. Em qualquer lado se pode praticar, dos 8 aos 80 anos, independentemente da classe social. Vemos, nos columbófilos, que há todo o tipo de proveniências. Há outro aspeto interessante: por muito dinheiro que se tenha e se queira investir, há que saber tratar dos pombos, ainda existem aqueles pequenos “ segredos”, que têm muita influência nos resultados finais. Tudo isto faz da columbofilia um desporto transversal e universal.
Quantas coletividades columbófilas existem nos Açores e em que Ilhas estão sediadas?
LS- Como vivo em São Miguel, sei mais sobre a columbofilia desta zona, um bocado menos das outras ilhas. Aqui funcionam dois clubes, um maior, com 23 columbófilos, que é o Clube Columbófilo de São Miguel, e um segundo, mais pequeno, que tem uma vertente mais cultural de divulgação, que é o Clube de Amigos da Columbofilia do Nordeste e são estes que, em conjunto, têm cerca de 80% a 90% dos columbófilos da ilha. Na Ilha Terceira há outro clube em atividade, com cerca de 10 columbófilos, com o qual estamos regularmente em contacto, por exemplo, para a realização do Campeonato Insular. Em tempos houve um clube na ilha do Faial, mas não tenho a certeza se ainda está em atividade. Olhando para a nossa realidade, podemos dizer que a grande atividade se passa aqui, em São Miguel e depois, em menor escala, na ilha da Terceira.
Existe alguma razão especial para essa localização dos clubes?
LS- Sim. A ilha de São Miguel é a maior do arquipélago, portanto mais de metade da população dos Açores, obviamente, que, assim tem mais gente e mais pessoas a gostar de pombos-correio. A segunda ilha com maior densidade populacional é a Terceira, daí ter também um clube.
A que ano remonta a prática da columbofilia nos Açores?
LS- A nível competitivo começou, de forma ininterrupta, há 16 anos. Eu estive na génese da mesma, pois fui um dos sócios fundadores do Clube Columbófilo de São Miguel, que fez, em 2016, 16 anos, e foi o grande pioneiro na prática da columbofilia na ilha. Depois havia outros clubes que também deram o seu contributo no início, como a Associação dos Agricultores de São Miguel, que tinha uma secção de columbofilia. Existiu um Clube de Jovens Columbófilos aqui, mas em termos competitivos, com associados e com mais pessoas a fazer esta atividade foi, no máximo há 16, 17 anos.
As diferenças entre a columbofilia terrestre e a columbofilia marítima também foram tema de conversa.
Sendo um conhecedor da modalidade quais as principais diferenças com que se deparou entre a columbofilia praticada no Continente e nas Ilhas, neste caso concreto nos Açores?
LS- As duas realidades não têm nada de semelhante, não há pontos comuns. Nós sabemos que o pombo, na natureza, é uma ave de voo terrestre, logo, o voo marítimo necessita de aprendizagem e de um período de adaptação. Nós, columbófilos açorianos, temos feito seleção de pombos ao longo dos anos. Temos pombos dos melhores columbófilos do Continente, de Espanha, de outros países da Europa, mas é preciso percebermos que nós aqui temos de ter programas de criação para vários anos, ou seja, aqueles borrachos que vêm para cá, no primeiro ano raramente conseguem resultados, só depois de alguns anos de adaptação ao meio é que conseguem mostrar valor. A maior diferença, na minha opinião, é a coragem, é a capacidade de se “atirarem” numa solta. Isto é difícil de “ver” num pombo, mas vamos pensar no seguinte: um pombo-correio aqui, numa prova, é solto em alto –mar a 100, 150, 200 milhas da praia, sem ter um ponto de referência, só tem água. Isto requer um enorme sentido de orientação. As tradicionais categorias da columbofilia terrestre: velocidade, meio-fundo e fundo, aqui diluem-se completamente. De certa forma, aqui, uma prova de 50 milhas marítimas (representa, em linha reta, quase 100 kms) pode ser equiparada a uma de fundo. Esta é a grande diferença, outra contrariedade que temos é o facto de os pombos serem soltos numa ilha e voarem, sobre o mar, para chegarem a outra ilha só no dia seguinte. Em suma eu acho que não há nenhum ponto comum em relação à columbofilia continental.
Quantas provas realizam por época desportiva? Que meios logísticos necessitam para praticar a columbofilia?
LS- A nível de logística é bem diferente do que acontece no Continente. Nós temos, entre as duas pontas de São Miguel, um extensão territorial aproximadamente, 70 kms entre as duas pontas da ilha, as provas em terra, o máximo que poderão ter, é até essa distância. Neste caso é exatamente igual ao que se faz no Continente: uma carrinha, um autocarro e meios semelhantes, mas o nosso calendário desportivo tem mais provas. Este ano fizemos oito provas com solta na Ilha de Santa Maria, daí até São Miguel são 54 milhas, dá aproximadamente 100 kms, fizemos ainda mais 8 provas de adultos e 10 de borrachos em altura diferentes, isto para o Campeonato de Santa Maria. Agora está a decorrer o da Ilha Terceira, onde os pombos são soltos em alto – mar até à ilha, num total de 6 provas. Para tudo isto já há grandes diferenças ao nível da organização, primeiro temos aquelas provas em que os pombos são transportados em carrinhas normais, para as provas inter-ilhas temos um acordo com a SATA Açores, porque os pombos-correio vão de avião para as outras ilhas, aí, no local da solta, temos os delegados, que recolhem as aves e as soltam no dia seguinte, isto é o mais básico e o que já fazemos há 16 anos. Para as provas de alto – mar há ainda outro tipo de logística necessária, que envolve o transporte dos pombos-correio num barco ou navio, depois, são soltos a uma determinada milha, numa hora previamente definida. Existe um protocolo com uma companhia de transporte marítimo que nos faz este serviço, eles são soltos a determinadas milhas da costa, são entregues e têm a prova no mesmo dia. É muito diferente da realidade da columbofilia terrestre.
Nos vossos calendários contemplam soltas inter-ilhas?
LS – Este ano avançámos com o 1º Campeonato Insular de Velocidade Terra – Mar – Terra. Este ano ainda sem o apoio oficial da Federação. O objetivo foi juntar os columbófilos dos clubes da Ilha de São Miguel e da Ilha da Terceira. Foram três provas na Ilha de São Miguel e três na Terceira, depois fizemos um coeficiente do qual conseguimos apurar o 1º campeão insular nessa especialidade. No futuro, e depois de termos falado com a Federação Portuguesa de Columbofilia, nomeadamente em reuniões tidas aqui, com o presidente, o Dr. José Luís Jacinto e o responsável pela área desportiva, Almerindo Mota, há a intenção de haver um Campeonato Insular com o apoio da FPC, quiçá Ibérico. Este ano foi lançado este campeonato “piloto”, porque achámos que não podíamos esperar mais e era importante envolver os columbófilos das nossas ilhas, o objetivo é envolver agora os da Madeira e os das Canárias.
A vossa época desportiva já terminou?
LS – Em termos competitivos, o nosso calendário vai até 8 de julho, data que marca o fim dos Campeonatos da Ilha Terceira. Depois temos uma outra solta, provavelmente na semana seguinte, a 15 de julho, uma prova que é a Clássica da Terceira. Em termos práticas, para terminar, faltam-nos três provas.
Deixamos um vídeo da RTP Açores, com uma entrevista em direto a Luís Soares. O programa Bom Dia Açores remonta a 3 de abril de 2009.
Um sonho e um objetivo: o Campeonato Insular Ibérico.
Falou da possibilidade de existir um Campeonato Insular Ibérico. Essa prova pode acontecer já na campanha desportiva de 2017?
LS – Claro que sim. As reuniões formais que tivemos aqui, em Abril, com a Federação, foram nesse sentido. Foi-nos lançado esse repto que nós decidimos abraçar. O objetivo é esse: a partir de 2017 haver um Campeonato Insular Ibérico, com o intuito de nos permitir ter “lugar” nas Exposições Nacionais e Ibéricas. O objetivo de qualquer columbófilo, quer seja continental ou insular, é mostrar os resultados do seu trabalho e da sua dedicação. Como referi é muito difícil fazer comparações com as provas do Continente, mas conseguimos diferenciar-nos pela positiva, com provas de 200, 250, 300 milhas náuticas, como fazem os nossos amigos da Madeira, isto em termos de mar, é, talvez, o equivalente a um grande fundo. Neste momento é muito difícil porque não existe exposição pública para este tipo de provas, não há competição organizada. Isto é o que nós queremos alterar. Vamos levar este projeto para a frente, para que as pessoas saibam que existe uma columbofilia marítima em Portugal, que não é igual à do Continente, mas que é tão competitiva como a continental.
– Sendo o número de praticantes ainda relativamente baixo vivem, no entanto, com grande intensidade a prática desta modalidade. Quais são as vossas principais dificuldades?
LS- Para nós a maior, talvez seja, ao nível do transporte e dos meios para fazer as soltas. Nem sempre temos facilidade em arranjar um barco ou um navio, o que obriga a uma permanente ligação e contacto com as companhias de navegação. No caso das soltas entre ilhas, há que diligenciar o transporte aéreo. Tudo isto dificulta muito a nossa atividade, para além do elevado custo financeiro. Para atenuar estas despesas temos feito diversas parcerias, mas é difícil. O segundo grande problema está relacionado com o conseguir mostrar às pessoas, nomeadamente às do Continente, a columbofilia que se faz aqui, mostrar aquilo que de bom acontece nos Açores ao nível columbófilo. Os pombos daqui são, necessariamente, diferentes, podem ter origens semelhantes, mas estão habituados a outras condições. Estes são os nossos dois grandes constrangimentos.
– Que opinião têm os columbófilos açorianos sobre as provas que são realizadas?
LS- Temos um ano à frente do clube, pelo que, esta é a primeira época com estes novos corpos gerentes. Tentámos e estamos a fazer um campeonato mais abrangente, com mais provas de diferentes vertentes, com distâncias e direções distintas, para poder dar aos columbófilos a opção de poder optar pela solta que mais lhe agradar, de maneira a conseguir competir e, eventualmente, vencer, nas várias categorias que existem. A opinião que recebemos tem sido positiva, as pessoas estão satisfeitas com o tipo de organização que nós temos.
No final da nossa conversa, o dirigente falou do apoio da FPC e deixou mensagens aos columbófilos portugueses.
– Como vê a colaboração da Federação e qual o papel que esta ligação deve ter no desenvolvimento da columbofilia nos Açores?
LS- É fundamental. É impossível haver columbofilia sem estarmos ligados à Federação, esse é o primeiro facto. Em conversas com o atual presidente da FPC costumo dizer que nós, aqui nos Açores, em termos práticos, no dia-a-dia não precisamos da FPC para fazer o nosso trabalho, talvez por sermos de uma Região Autónoma, estamos habituado a “fazer tudo sozinhos”, mas apesar disto a columbofilia só será muito importante aqui, se existir uma ligação forte com a Federação. No futuro este apoio federativo é essencial, por exemplo para a realização do Campeonato Insular. Temos de “caminhar de mãos dadas”, porque é algo que é útil às duas partes.
Que mensagem gostava de deixar aos columbófilos açorianos?
LS- A todos os columbófilos açorianos gostava de pedir para não deixarem de apoiar os seus clubes e que não deixem de lutar por uma columbofilia insular unida. Se tentarmos copiar a columbofilia continental não vamos “a lado nenhum”, necessitamos é de aproveitar as potencialidades e as particularidades da nossa. Temos que usar todos os instrumentos para mostrar a qualidade da nossa columbofilia.
E para os columbófilos de Portugal Continental, qual é a mensagem?
LS- Reparem naquilo que se faz nos Açores, que é algo de meritório. Já não é uma columbofilia “de terceiro mundo”, quem vier aqui e visitar os nossos pombais, vai reparar que estão extremamente bem cuidados, com pombos-correio bem tratados e selecionados. De facto é uma columbofilia diferente, mas com muita qualidade.